A mulher sentada à beira da calçada na avenida Nossa Senhora de
Copacabana só se sente em casa vivendo na rua – estar entre paredes a
oprime, ela tem a sensação de que vai morrer sufocada. É tão fina e
educada que todos a chamam de Princesa. Seu “lar” é um trecho do piso de
cimento delimitado por pedaços de papelão. Muito gorda, tem dificuldade
para se mover. Mesmo assim, não descuida da aparência – alisa bem o
vestido sobre as pernas esticadas, penteia-se com esmero e passa batom
com pelo menos frequência – sempre que recebe a visita do delegado
Espinosa. E o delegado Espinosa visita Princesa várias vezes por dia.
Afinal, tudo indica que ela viu quem enfiou uma faca no homem muito
branco, talvez um estrangeiro, que amanheceu morto na calçada a alguns
metros dela. Mas Princesa costuma sonhar, às vezes até quando está
acordada. Isaías é o grande amigo de Princesa. Ele sabe que a amiga viu
alguma coisa que não deve ser lembrada. Acredita que precisa proteger a
qualquer custo a moça dos perigos que podem surgir da noite – quando ela
dorme sozinha na calçada – e do dia, quando os passantes são tantos que
é difícil distinguir o inimigo que se aproxima para desferir um golpe.
Como Princesa, Isaías é incapaz de lidar com o mundo complicado onde os
dois vivem; como ela, é indefeso e vulnerável.
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